Os Nossos Amigos

domingo, fevereiro 12, 2006

Parto domiciliário

Como dar à luz à moda antiga

Rita e João, Cristina e Américo, Walesca e Demitri, são três casais que têm em comum o facto de escolherem ter os filhos na própria casa, longe do sistema hospitalar. O que os move é a luta pelo direito a um parto humanizado.

Rita, 34 anos, e João, 27, deram as boas-vindas ao Rafael há três meses. No seu apartamento, na Ericeira, não se assiste, contudo, a cenas típicas de filme: casal desesperado entre fraldas e biberões. Respira-se tranquilidade. Sob um calor aconchegante, Rita segura o seu bebé nos braços para lhe dar de mamar. E embalada pelo silêncio viaja até um passado não muito distante para recordar o dia em que ela e o marido receberam a notícia de uma gravidez inesperada. “Não estava planeado para vir tão cedo, mas ficámos felizes”, começa por dizer a psicóloga. (...)

Primeiro, o casal considerou a hipótese de ter o Rafael dentro de água. No entanto, foram confrontados com a ausência de maternidades e clínicas que possibilitassem este sonho. Sem desmoralizar, seguiram rumo ao plano B: o parto domiciliar. Nos tempos seguintes, consumiram tanta informação quanto possível. “A sociedade de hoje é que faz com que nos esqueçamos dos nossos instintos. A natureza sabe aquilo que faz”, adiantam sobre aquilo que retiveram. Depois, trocaram referências com outros pais acerca de parteiras habilitadas. “Não queríamos passar pelos procedimentos hospitalares, sem privacidade, com todos a dar ordens, barulho e muita luz”, confidenciam. A partir daí nada nem ninguém os faria mudar de ideias.

No grande dia, estava tudo a postos para receber o novo membro da família. À luz de velas e sentados na cama, abraçados um ao outro, Rita e João trouxeram o Rafael ao mundo. “Tudo tinha a nossa energia. Foi um momento mágico”, diz Rita. João, por sua vez, não consegue imaginar o que seria não partilhar o nascimento do filho com a mulher. “Fui a primeira pessoa que o Rafael viu mal saiu da barriga da mãe”, acrescenta babado.

(...)

Foi precisamente o que fizeram Cristina, 40 anos, e Américo Torres, 42. O casal decidiu confiar o nascimento do último de dez filhos a esta parteira depois de passarem por uma experiência hospitalar menos feliz. Tudo começou quando após o nascimento de mais um descendente, julgando já ter passado por tudo, se deparam com a necessidade de realizar uma cesariana. “Penso que se os médicos tivessem dado ouvidos talvez pudesse ter sido evitada”, revela Cristina. Com a pulga atrás da orelha, tratou de se inteirar sobre o parto e a sua fisiologia. Deparou-se com um conceito do qual nunca tinha ouvido falar: o parto humanizado. “Percebi que a gravidez não é patológica, mas os médicos comportam-se como se fosse. Padronizam os partos, ensinam as pessoas a ir por um só caminho”, afirma.

(...)

A experiência foi tão positiva que tempos depois o casal decidia aumentar novamente a família. Nessa altura, já Cristina tinha tratado de enriquecer os seus conhecimentos. Facto esse que a levava agora a ter uma nova certeza: “este bebé vai nascer em casa!’”. O marido, Américo, é que não foi fácil de convencer. “Por ignorância”, admite ele, hoje. “Mas, ao fim de uma hora, ela já me tinha dado a volta”, confidencia, entre gargalhadas. E a lição ficou bem estudada: “Há uma grande diferença entre o parto domiciliar e o hospitalar. É que no primeiro as pessoas têm noção do perigo, no segundo não têm noção nenhuma”, dispara.

(...)

CRISTINA RECORDA com um brilho especial nos olhos aquele dia quente de Julho em que o amor da sua família saiu reforçado: “Minutos depois já estávamos todos reunidos a dar-lhe o primeiro banho. Um dos meus filhos olhou para o irmão, aninhou-se a ele e deu-lhe uma lambidela na cabeça”, relata.

Desta experiência nasceu a necessidade de chamar outros casais à verdade sobre as maravilhas escondidas por detrás de um parto. Nasceu a Humpar (http://www.humpar.org/), Associação Portuguesa pela Humanização do Parto.“Depois de ouvirmos os traumas de algumas pessoas percebemos a necessidade de relatar as nossas vivências e conhecimentos. Acreditamos que a partir desta ajuda mais ninguém poderá dizer que passou por uma experiência horrível”, assegura Américo. Cristina ressalva, no entanto, que a Associação não tem por base radicalismos “queremos seguir a linha do senso comum”. E diz mais: “Nós não somos contra o parto hospitalar, somos contra o parto hospitalar não humanizado”. “Infelizmente nos hospitais portugueses isso não existe, só em casos muito pontuais”, garante Américo.

(...)

Tempos depois, já em desespero, o casal encontrou uma nova esperança: “Através de um site da Internet descobrimos que existem doulas (acompanhantes de grávidas) em Portugal. Liguei para uma, expliquei a minha situação, fartei-me de chorar, e ela falou-me da possibilidade de ter um parto domiciliar”. Inicialmente, a ideia pareceu-lhes estranha. “Claro que tive algum receio até porque o meu primeiro filho nasceu de cesariana mas o meu medo maior era ter o Enzo no Hospital”, afirma Walesca. Mas decidiram avançar. Ao lado do marido, da parteira e de uma doula, Walesca trouxe Enzo ao mundo. E uma hora depois estava como nova, a tomar um chá na sala. Hoje, o casal só tem pena de não se ter informado sobre o parto humanizado há mais tempo. “Percebi que era um ignorante e rendi-me às evidências”, diz Demitri. Definitivamente o parto humanizado encheu-lhe as medidas.

PRINCIPAIS MOTIVOS

RAZÕES QUE LEVAM AO PARTO DOMICILIAR

- Evitar drogas, anestesias e intervenções.

- Fugir ao atendimento massificado e pouco personalizado das maternidades.

- Fugir ao ambiente hostil dos hospitais.

- Evitar passar por experiências hospitalares anteriores próprias ou alheias.

- Desfrutar de um ambiente tranquilo, sem luzes ofuscantes, cheiros estranhos.

- Estar apenas ao lado de pessoas com quem se tem uma ligação afectiva.

- Possibilidade de ficar com o bebé logo após o seu nascimento, senti-lo, cheirá-lo...

- Fazer questão da presença e participação do marido.

- O parto não é uma doença, um fenómeno fisiológico.

- Liberdade de expressão, de movimentos.

- Deixar acontecer.

CONSELHOS

CONDIÇÕES PARA TER UM FILHO EM CASA

- Tomar uma decisão esclarecida e responsável.

- Aprovação total do marido.

- Crescimento uterino normal (bebé nem muito grande, nem muito pequeno).

- Pressão arterial normal.

- Apresentação cefálica (bebé virado de cabeça).

- Gestação a termo (entre 37 e 41 semanas).

- Nunca ter tido uma cesariana (relativo).

Retirado do Correio da Manhã, podem ler tudo aqui

2 comentários:

Anónimo disse...

pois, é tudo mto bonito e romantico, mas atenção, toda essa imagem de felicidade pode descambar em tragedia
não nos devemos esquecer que se algo correr mal, em casa poucos meios teremos para resolver a situação e nem a melhor parteira caseira fará milagres
claro que podem dizer que sempre se nasceu assim, á milhares de anos que se dá á luz naturalmente em casa, em mtos paises essa é a unica alternativa, mas convem ver a taxa de nados mortos(sim, é um nome horrivel)desses tempos e paises para se ver que nem tudo são rosas
falo por experiencia propria, no nosso caso e apesar de alguns contratempos na gravidez, uma hemorragia que levou a internamento a meio e a diabetes gestacional tudo indicava que o parto fosse perfeitamente normal
ali estava eu ao lado da minha mulher para assistir ao nascimento da nossa filha no que se adivinhava ser uma longa espera, e no entanto em poucos minutos tudo mudou
a placenta descolou por completo e o cordão estava á frente e parcialmente enrolado no pescoço
se normalmente as gravidas tem que fazer força para o bébé nascer, ali teve que ser ao contrario e a enfermeira teve que segurar a criança para não nascer e sufocar, parece irreal, mas aconteceu assim, eu ainda consegui ver a agitação antes de ser corrido da sala "com 2 quentes e 2 fervendo" e a levarem para a sala de operações para uma cesariana de emergencia
a equipe medica foi de primeira, medicas experientes que se aperceberam logo do perigo
uma situação dessas passada em casa teria posto a vida das 2 em risco e possivelmente teria sido fatal
por isso alem de olharmos para o ar romantico e aconchegante do parto em casa, devemos tambem analizar os "ses" da vida e interrogarmo-nos se seriamos capazes de viver com o desgosto de um problema que poderiamos ter evitado

Repolha disse...

Não poderia dizer de forma tão bem dita. Faço minhas as palavras do pai da Raquel.