Há mulheres que realizam citologias em excesso, chegando a submeter-se anualmente a mais do que um exame ao colo do útero. Outras não fazem nenhum por falta de meios. O contraste deverá acabar com um rastreio nacional.
Helena Oliveira é presidente da Sociedade Portuguesa de Citologia (SPC) e revelou à Lusa que há mulheres que estão a realizar mais citologias (análise de células recolhidas no colo do útero, através do exame Papanicolau) do que as recomendadas.
«Há uma franja de mulheres que são atendidas no sector privado e que são as próprias a solicitar as citologias, pois ficam alarmadas com as notícias sobre o cancro do colo do útero», contou a presidente da SPC.
O cancro do colo do útero mata anualmente 300 mulheres em Portugal. Desde o início do mês que a vacina contra o vírus do papiloma humano está a ser administrada gratuitamente, no âmbito do Programa Nacional de Vacinação (PNV).
Apesar das recomendações apontarem para a realização de uma citologia de cinco em cinco anos, após dois exames negativos, há mulheres que chegam a realizar mais do que uma citologia por ano.
«Alguns médicos têm receio de contrariar o pedido das clientes e acabam por realizar o exame mais do que é necessário, o que é uma perda de recursos», adiantou.
Este excesso, que segundo Helena Oliveira não tem riscos para a saúde, contrasta com a falta destes exames na maioria das mulheres, principalmente as que não são seguidas por um ginecologista e não têm médico de família.
«Há uma quantidade enorme de mulheres que não faz as citologias necessárias. Algumas porque não têm meios para serem seguidas por ginecologistas e outras porque não têm médico de família, nem conseguem estes exames nos centros de saúde», disse.
Para o presidente da Associação Portuguesa dos Médicos de Clínica Geral (APMCG), Eduardo Mendes, a realização de citologias «pode e deve» ser feita pelo médico de família.
«Trata-se de um exame que não tem grandes necessidades tecnológicas», explicou.
Eduardo Mendes ressalva que este exame «tem vindo a crescer» e que «as mulheres estão cada vez mais sensibilizadas para a sua importância».
«É fácil, simples, barato e não tem risco associado», disse.
A mesma ideia tem Ana Luísa Teixeira de Sousa, ginecologista e especialista em citologia, tendo introduzido este exame em Portugal, em 1971.
Em entrevista à Lusa, a médica defendeu a importância do Papanicolau, exame criado pelo médico George Papanicolau em 1940.
«É um teste que não custa nada, absolutamente inofensivo e que cada vez mais mulheres fazem com naturalidade», disse.
A especialista lembrou que, no passado, era mais fácil encontrar mulheres reticentes em fazer um exame ginecológico e que algumas até se recusavam.
Hoje em dia a situação melhorou, mas ainda existem muitas diferenças: «Há mulheres que fazem regularmente um controlo ginecológico, incluindo nele a citologia, e outras que não têm essa rotina tão estabelecida», disse.
Ana Luísa Teixeira de Sousa aproveita para ressalvar que nenhuma das medidas - rastreio e vacinação - é suficiente para, isolada, combater o cancro do colo do útero.
«É simplista reduzir o problema do cancro do colo do útero à vacina e ao teste Papanicolau», disse.
A especialista defende uma aposta na educação dos mais jovens e na formação dos profissionais de saúde que lidam directamente com esta área.
«Toda a medicina está em constante evolução e nada, nem a vacina, é uma garantia a 100 por cento», disse, lembrando que continuam a ser feitos estudos com a vacina que entrou agora no PNV.
Os diferentes comportamentos que se encontram nesta área são confirmados pelo presidente da Sociedade Portuguesa Ginecologia (SPG), José Martinez de Oliveira.
O especialista disse à Lusa que existe, por um lado, «uma população esclarecida que faz o exame de uma forma mais ou menos organizada e disciplinada, ainda que não seja um rastreio».
Por outro lado, esta organização não existe em muitas outras mulheres.
José Martinez de Oliveira considera que os rastreios ao cancro do colo do útero, que avançarão em breve, deverão pôr alguma ordem na forma como as mulheres controlam ou não esta questão.
«O rastreio vai apanhar aquelas mulheres que normalmente ficariam de fora», avançou.
O presidente da Sociedade Portuguesa de Papilomavirus (SPPV), Rui Medeiros, reconheceu à Lusa que «o desconforto é obviamente um dos problemas a ter em conta» neste exame.
O coordenador do Grupo de Oncologia Molecular e Virologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto adiantou que «existem já algumas alternativas em investigação que envolvem um processo simples de autocolheita e a utilização dos novos métodos de biologia molecular para a detecção do HPV».
Diário Digital / Lusa
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